terça-feira, 22 de janeiro de 2008

Pelo reconhecimento dos Direitos Humanos dos Imigrantes Irregulares

Agência Ecclesia: Pelo reconhecimento dos Direitos Humanos dos Imigrantes Irregulares

Comissão Nacional Justiça e Paz

1. A existência de um número muito importante de imigrantes irregulares a viver na Europa e em Portugal é uma realidade.
Não há estatísticas exactas sobre o volume de imigrantes irregulares, ou seja, os nacionais de terceiros estados ou apátridas, que não possuem um documento válido, autorizando a sua estadia no país. As estimativas existentes apontam, na Europa, para várias centenas de milhar, senão milhões, de imigrantes irregulares.
Em Portugal, a realização das regularizações extraordinárias permitiu ficar a conhecer melhor esta realidade, que chegou a assumir uma grande relevância, tendo em conta o volume de pessoas cobertas por aquelas regularizações. Sabe-se, porém, que continuam a residir, entre nós, muitos imigrantes em situação irregular, sendo também possível acontecer que, imigrantes em posição regular, passem a situação irregular, devido a procedimentos administrativos morosos, desconhecimento da lei, perda do emprego, e outros factores.
2. As pressões para a imigração relacionam-se com a incapacidade da globalização criar novas oportunidades de trabalho nos locais onde as pessoas vivem, ao mesmo tempo que se acentuam as disparidades de rendimento e de padrões de vida. Frequentemente a imigração não resulta de uma livre escolha, como deveria ser, mas de uma verdadeira luta pela sobrevivência. É este o quadro em que se situa o fenómeno da imigração irregular.
3. São várias as circunstâncias que levam a situações de irregularidade, sendo necessário encontrar respostas para estas situações. Hoje, acredita-se que elas têm origem no fracasso das políticas de imigração seguidas desde há vários anos, sendo também de assinalar a acção do tráfico de pessoas. Entretanto, mantêm-se, quando não se acentuaram, as desigualdades económicas entre o Norte e o Sul, para além das guerras, conflitos, violação dos direitos humanos, desastres naturais e outras razões, que levam as pessoas a procurar condições de vida mais dignas, na ausência ou grande precariedade destas condições nos países de origem. Ora, combater a imigração irregular na Europa deveria levar, antes de mais, a lutar contra as causas das migrações forçadas, já que ninguém deixa o seu país sem razão. Por outro lado, é preciso reconhecer que as migrações foram e continuam a ser uma oportunidade para as economias europeias. A imigração tem enriquecido a sociedade portuguesa, tanto no aspecto económico como cultural e pode contribuir para o desenvolvimento dos países de origem, se for também acompanhada por uma eficaz política de ajuda ao desenvolvimento.
4. Todos os anos, milhares de imigrantes morrem ou são sujeitos a graves violações dos direitos humanos, ao tentarem aceder e trabalhar nos países de trânsito ou de destino. Um olhar sobre a situação dos imigrantes revela que muitos governos, empregadores e outros actores da sociedade civil não estão a cumprir com as suas obrigações e responsabilidades para com os imigrantes, particularmente os irregulares. Eles estão muitas vezes sujeitos á exploração do seu trabalho, a abusos e a falta de protecção no acesso ao alojamento, cuidados de saúde, justiça e educação dos filhos. Acresce que se arriscam a ser detidos ou expulsos para os seus países, no caso de se queixarem às autoridades.
5. O debate sobre a imigração tem contudo prestado muito pouca atenção à questão dos direitos humanos dos imigrantes, em contradição com a Declaração Universal dos Direitos Humanos, que afirma que “Todos os seres humanos nasceram livres e iguais em dignidade e direitos, São dotados de razão e consciência e devem actuar uns com os outros em espírito de irmandade”. Daí que devam ser garantidas condições de vida que respeitem a dignidade humana a todos, incluindo o exercício de direitos básicos, independentemente da sua situação. A defesa e o reconhecimento dos direitos humanos dos imigrantes irregulares ganham, assim, uma importância fundamental na condução das políticas de imigração. Estes direitos estão relacionados com a integridade física e moral dos seres humanos e com a sua liberdade: o direito à vida, o direito a não serem sujeitos a tortura ou a tratamento desumano e degradante, o direito a não estarem sujeitos à escravidão ou servidão, os direitos familiares, o direito à segurança e liberdade e contra as detenções arbitrárias. Estes direitos estão reflectidos na Mensagem Evangélica e na Doutrina Social da Igreja. Para que se tornem efectivos, é necessário o empenhamento dos governos dos países de origem e de destino, das autoridades locais, dos empregadores, dos próprios migrantes e da sociedade civil.
6. É certo que a generalidade dos países europeus e, também Portugal, subscreveram e ratificaram algumas das Convenções Internacionais sobre os Direitos Humanos. Ora, mesmo quando as leis internacionais prevêem derrogações e restrições aos direitos humanos, alguns deles são considerados inalienáveis e impõem obrigações incondicionais aos Estados, que não os podem recusar a pessoas em situação irregular. Particularmente relevantes, nesta matéria, são a Convenção Europeia para a Protecção dos Direitos Humanos, onde estão contemplados alguns dos direitos fundamentais dos imigrantes irregulares. Existem também Convenções Internacionais de Protecção dos Migrantes, tendo designadamente Portugal ratificado as Convenções nº 97 (1949) e 143 (1975) da OIT.
No entanto, porque as migrações são um fenómeno complexo, que cobre várias dimensões, torna-se necessário um corpo coerente de legislação internacional sobre as migrações, que reúna, aperfeiçoe e complemente as obrigações até agora dispersas por vários instrumentos, e que tenha em conta os desenvolvimentos recentes, designadamente o que está a acontecer com os fluxos migratórios em direcção à Europa. Daí a importância da Convenção das Nações Unidas sobre a Protecção dos Direitos de todos os Trabalhadores Migrantes e dos Membros das Suas Famílias, que entrou em vigor em 2003, mas que não foi ratificada por nenhum Estado Europeu, à excepção da Bósnia Herzegovina e da Turquia (só assinatura, mas não a ratificação). Desde 2003 que têm vindo a verificar-se, tanto a nível internacional, como nacional, campanhas e apelos aos governos, com vista à ratificação desta Convenção.
Mais recentemente, reconhecendo que não existe um único instrumento internacional que se ocupe especificamente da protecção dos imigrantes irregulares e que são incertos os direitos mínimos que lhes são reconhecidos, a Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa aprovou, em 27 de Junho de 2006, a Resolução 1755, sobre o Direitos Humanos dos Migrantes Irregulares, que terá que ser apresentada à aprovação do Comité de Ministros do mesmo Conselho, sendo importante que os vários Estados Membros se pronunciem a favor da adopção da Resolução.
7. A Conferência Europeia das Comissões Nacionais Justiça e Paz entendeu, na sequência das campanhas que têm sido desenvolvidas por várias organizações da sociedade civil, apelar mais uma vez aos governos, no sentido da adopção daqueles dois documento e, dessa forma contribuir para a construção de uma Europa mais justa e mais consciente das suas responsabilidades em relação aos países do Sul.
A Comissão Nacional Justiça e Paz de Portugal está empenhada nesta acção, em conjunto com as restantes Comissões europeias. Trata-se de mais uma campanha a favor dos direitos dos imigrantes, que vem ao encontro dos esforços já desenvolvidos por muitas ONG portuguesas, com vista à ratificação da Convenção das Nações Unidas.
Esta actuação é tanto mais pertinente quanto Portugal se rege por uma Constituição baseada na dignidade da pessoa humana e que aplica a estrangeiros ou apátridas que aqui se encontrem a quase totalidade dos direitos atribuídos aos cidadãos nacionais. Também o Governo pretende ver aprovada uma Lei da Imigração e lançou recentemente um Anteprojecto de Plano de Acção para a Integração dos Imigrantes onde se incluem medidas que se destinam também a imigrantes em situação irregular.
Acresce que os temas da imigração constituem uma das prioridades da Presidência Portuguesa da União Europeia, no segundo semestre de 2007, estando o país em posição privilegiada para fazer propostas aos restantes parceiros, conducentes a uma melhor protecção dos imigrantes irregulares.
Ao realizar esta campanha, a Comissão portuguesa não esquece que, para lá da declaração dos direitos humanos, é necessário assegurar a salvaguarda desses direitos na prática, o que supõe um compromisso forte do governo e do Parlamento nesse sentido, designadamente através da adopção dos dois Instrumentos Internacionais em causa.
Pretendemos por isso:
• Conhecer e dar a conhecer a posição do governo, partidos políticos com representação na Assembleia da República, Confederações Patronais e Sindicais, em relação ao conteúdo dos Instrumentos Internacionais em análise (para o efeito, é lançado um questionário)
• Interpelar o Senhor Provedor da Justiça com vista a que seja assegurado o reconhecimento dos direitos humanos dos imigrantes irregulares, em Portugal
• Pedir que Portugal adopte, no Conselho de Ministros do Conselho da Europa, a Resolução 1755 e sensibilize os governos dos outros países para que adoptem igualmente a Resolução
• Apelar para que seja ratificada, juntamente com os restantes parceiros comunitários, a Convenção das Nações Unidas sobre a Protecção dos Direitos de todos os Trabalhadores Migrantes e dos Membros das Suas Famílias.
Associaram-se a esta Acção as seguintes organizações: Amnistia Internacional – Secção Portuguesa, CARITAS, Centro Padre Alves Correia, Comissão Justiça e Paz da Conferência dos Institutos Religiosos, Fundação Evangelização e Culturas, Solidariedade Imigrante, Obra Católica Portuguesa de Migrações
Lisboa, 16 de Janeiro de 2007

Fonte: http://agencia.ecclesia.pt/noticia.asp?noticiaid=41704

segunda-feira, 21 de janeiro de 2008

O imigrante português no Brasil: figurações e configurações da identidade cultural

O imigrante português no Brasil: figurações e configurações da identidade cultural

Shirley de Souza Gomes Carreira
UNIGRANRIO

Quem não soube
Quem não sabe
Emigrante
Que toda partida é potência na morte
E todo regresso é infância que soletra
Corsino Fortes(1)

A situação específica do imigrante, assim como a do exilado, concorre para a formação de figurações e configurações múltiplas de identidade causadas pela busca do sentido de "pertencimento" e pela tentativa de recuperar o que Marc Augé denomina "lugar antropológico". Segundo Marc Augé (1994, 31), a investigação antropológica tem por objeto analisar o modo pelo qual os indivíduos interpretam a categoria do outro, conferindo-lhe um lugar, uma raça ou uma etnia. O sentido de "pertencimento" vai além de um limite puramente físico, portanto, o "lugar antropológico" é a construção concreta e simbólica do espaço que o indivíduo reivindica como seu; que sintetiza todo o seu percurso cultural; que é, ao mesmo tempo, identitário, relacional e histórico.

Este ensaio pretende analisar o processo de formação e representação da identidade cultural do imigrante português no Brasil, bem como o papel da literatura na construção do locus identitário. Para tanto, faremos uma breve retrospectiva do movimento migratório dos portugueses para o Brasil, bem como procederemos à análise de personagens da literatura brasileira, mais especificamente de O cortiço, de Aluísio Azevedo, obra do período realista, a fim de demonstrar o modo pelo qual se criam e perpetuam os estereótipos.

Contemporaneamente, os estudos antropológicos têm constatado que os modelos teóricos de aculturação existentes tendem a ser substituídos por uma visão de interdependência entre o imigrante e a comunidade que o acolhe. Segundo essa perspectiva, pode-se observar que a herança lusitana não se esgota na questão lingüística, na arquitetura das cidades coloniais, na culinária e em outros traços que marcam a forte presença do português na cultura "brasileira", que, ao contrário do que se pensa, não se deve primordialmente à fase colonial, mas, em grande parte, às ondas migratórias posteriores; aos inúmeros portugueses que aqui encontraram uma maneira de construir o seu "lugar antropológico", em substituição à terra natal. A herança lusitana é na realidade parte de um fenômeno que somente no mundo contemporâneo encontra solo fértil para a sua investigação: a transculturação.
A questão da identidade tem sido amplamente examinada a partir das discussões geradas pelos Estudos Pós-coloniais e qualquer pesquisa nesse sentido necessita tecer considerações a respeito da concepção contemporânea de identidade. Stuart Hall (1998, p.7), em sua análise da evolução do conceito de identidade, mapeia as mudanças de sentido causadas pelo que ele considera uma "crise" originada pela ação conjunta de um duplo deslocamento: a descentralização dos indivíduos tanto do seu lugar no mundo social e cultural quanto de si mesmos. Essa mutação desenvolveu-se desde a postura de sujeito do iluminismo, evoluindo para a concepção de sujeito sociológico, até atingir o que os teóricos definem como o sujeito pós-moderno. Do sujeito individualista do iluminismo, centrado, dotado das capacidades de consciência e razão, passou-se à noção de sujeito sociológico, que, pela primeira vez, reconhecia a importância de outros "eus", através dos quais os valores, sentidos e símbolos do mundo por ele habitado eram mediados. Houve, portanto, um salto da individualização para a interação. Embora o "eu real" permaneça, sua postura é terminantemente modificada pelo diálogo contínuo com o mundo exterior. Na pós-modernidade, surge um sujeito fragmentado, sem identidade fixa permanente, que é "formado e transformado continuamente em relação às formas pelas quais somos representados ou interpelados nos sistemas culturais que nos rodeiam".
A questão da identidade assume uma feição particular ao derivar da condição da migração ou do exílio. Análises da relação do individuo migrante com o meio apontam para processos distintos que podem ser focalizados a partir dos conceitos de "imigração econômica" e "imigração de assentamento". No primeiro caso, os imigrantes constituem um grupo de trabalhadores estrangeiros que interpretam sua condição de vida e a sua relação com o meio como algo provisório. No segundo caso, à medida que a possibilidade de retorno ao país de origem torna-se mais remota, a relação puramente instrumental com a vida econômica do período imigratório inicial é extrapolada, estabelecendo-se um vínculo com os países receptores. Conseqüentemente, os processos de relação do imigrante com o país de adoção variam de uma total resistência aos costumes locais à completa assimilação.
Iolanda Maria Alves Évora (2001), em seu ensaio "A metáfora do nacional", no qual analisa a questão da migração e da identidade cabo-verdiana, aponta para o fato de que a permanência do imigrante mostra que a idéia do retorno deve ser compreendida muito mais como uma categoria que o prevê a nível fantasmático do que o retorno físico. O mito é para o imigrado um retorno sobre si, um retorno sobre o tempo anterior à emigração, pois, muito embora se possa voltar ao lugar de origem, não se pode voltar ao tempo da partida, nem ao indivíduo que se era no momento da partida (Sayad, 1998, p.17).
Os registros da imigração portuguesa apareceram no século XVIII e se tornaram mais regulares a partir do século XIX. Nos primeiros dois séculos de colonização vieram para o Brasil cerca de 100 mil portugueses, e uma média anual de 500 imigrantes. No século seguinte, foram registrados 600 mil e uma média anual de 10 mil imigrantes portugueses. O ápice do fluxo migratório ocorreu na primeira metade do século XX, entre 1901 e 1930, quando a média anual ultrapassou a barreira dos 25 mil.
Segundo Renato Pinto Venâncio (2000), em seu ensaio "Presença de portugueses: de colonizadores a imigrantes", na história da imigração portuguesa podem ser consideradas quatro fases: de imigração restrita (1500-1700), de transição (1701-1850), de massa (1851-1930) e de declínio (1960-1991). Cada uma delas caracterizou-se por um perfil específico de imigrante. Na fase de transição, começou, ainda que discretamente, a emigração de grupos oriundos de camadas sociais pobres. A partir de meados do século XIX, durante a fase de imigração de massa, o perfil do imigrante português sofreu uma radical transformação: entre os que chegavam predominavam os de origem pobre: pequenos proprietários rurais, rudes, originários do norte de Portugal, da região do Minho, que contribuíram para a formação da imagem negativa e preconceituosa do imigrante português, estigmatizando-o como uma pessoa intelectualmente pouco qualificada e alvo de um anedotário pouco condizente com a rica herança cultural que ele nos deixou.
Nos últimos anos do século XIX, o Rio de Janeiro começou a se tornar um pólo da colônia portuguesa: a cidade recebeu um fluxo contínuo de imigrantes lusitanos, especialmente após 1890 (Chalhoub, 1986, p.5). Ao enorme exército de mão-de-obra disponível formado por brasileiros, brancos pobres, mestiços ou negros recém-libertos, somaram-se os portugueses que fugiam da grave crise econômica que se abatera sobre a zona rural de Portugal a partir de então.
Segundo Hall (2003, p.28), a par dos variados motivos que geram a migração, dentre eles a pobreza, a falta de oportunidades e o subdesenvolvimento, cada disseminação carrega consigo a promessa de um retorno redentor; sonho esse acalentado pelos primeiros imigrantes portugueses que vieram para o Brasil.
A declaração de perpétua aliança e os acordos comerciais tornavam Portugal uma nação amiga, gozando de vantagens tributárias sobre as demais nações. Graças ao tratamento diferenciado para os produtos importados e à mobilidade que desfrutavam dentro do segmento urbano da sociedade de ordem escravocrata, os portugueses, na grande maioria donos de estabelecimentos de comércio varejista e armazéns de secos e molhados (Alvim, 1998, p.285), puderam acumular fortunas significativas. Em conseqüência, o imigrante português passa a ter uma dupla representação: na literatura portuguesa do século XIX, o português que retorna à pátria, enriquecido pelo ouro brasileiro é enaltecido, enquanto que, no Brasil, essa mesma condição é interpretada de modo invertido.
A concepção binária de diferença, fundamentada sobre a construção de uma fronteira de exclusão, depende da construção de um "Outro". Para o brasileiro de então, o português era usurpador das riquezas naturais, o explorador da gente pobre da terra; e essa visão mobilizou um sentimento antilusitano na população, enraizando o preconceito contra o colonizador. O imigrante era associado de modo pejorativo à acumulação e à usura, como se pode observar, por exemplo, na narrativa romântica de José de Alencar, em A guerra dos mascates, romance que se reporta a um episódio da história do Brasil: a Guerra dos Mascates; luta travada entre as cidades de Olinda e Recife, nos anos de 1710 e 1711, pelos pernambucanos proprietários de engenhos, empobrecidos pela decadência da atividade agroindustrial açucareira, que viam com desconfiança a prosperidade de Recife, onde residiam os mascates, como eram designados os comerciantes portugueses, com os quais foram obrigados a endividar-se, por meio de empréstimos feitos a altos juros, resultando forte animosidade.
O início da República em Portugal, em 1910, só fez aumentar a "debandada" para o Brasil. No entanto, ao invés de trabalhadores pobres e iletrados; os portugueses que começaram a aportar no Rio de Janeiro na década de 10 eram da classe média: vinham para se fixar no Brasil, trazendo um pequeno capital financeiro ou cultural e com o objetivo expresso de se tornarem empreendedores ou profissionais liberais.
À medida que a lusofobia aumentava, os imigrantes se viram levados a assumir a promoção e a preservação dos vínculos culturais com seu país de origem. Já que a distância forçada de sua terra natal não podia ser superada, restava-lhes tentar recuperar algo do seu "lugar antropológico" (Augé, 1994, p.33).
Essa necessidade de reconstruir a identidade lusa no Brasil levou ao desenvolvimento de estratégias de inclusão, destinadas a proporcionar condições de adaptação em um ambiente hostil.
A tentativa de manutenção da identidade cultural levou-os a formar pequenos grupamentos, sob a forma de agremiações, fundar revistas e estimular a interação da comunidade lusitana:
Possuir uma identidade cultural nesse sentido é estar permanentemente em contato com um núcleo imutável e atemporal, ligando ao passado, o futuro e o presente numa linha ininterrupta. Esse cordão umbilical é o que chamamos de "tradição", cujo teste é o de sua fidelidade às origens.(Hall, 2003, p.29)

O reconhecimento da diferença requer que se penetre na sua lógica simbólica, em que a existência real da identidade supõe a afirmação oficial dessa diferença garantida jurídica e politicamente, porque a assimilação "encerra o principio da dominação de uma identidade sobre outra, da negação de uma identidade por outra" (Bourdieu, 1989,129).
Constituíram-se, então, dois eixos opostos: de um lado a visão antilusitanista, de outro a postura a favor do luso-brasilianismo. Os que pendiam para a xenofobia nacionalista apoiavam-se no estereótipo internalizado no imaginário do povo e alimentado pela literatura: a imagem negativa, focalizada na ganância enquanto característica moral, na aparência corpulenta como marca física e na rusticidade como dado de comportamento, conforme registra Nélson Vieira (1991). Os que se manifestavam a favor de um estreitamento de relações entre Brasil e Portugal, o faziam com base na afirmação de que a língua e os costumes eram fatores de identificação espontânea que facilitavam a formação de um bloco cultural, impedindo a descaracterização da população brasileira; além do que a criação de um bloco militar poderia ser capaz de enfrentar a ameaça latente vinda das nações do Norte em caso de guerra (Romero, 1902).
A literatura naturalista contribuiu enormemente para o fortalecimento do estereótipo. Em O mulato (1881), Aluísio Azevedo, descendente de portugueses e adepto das idéias antilusitanas, projeta na pessoa de Manuel Pescada as características do imigrante trabalhador, ambicioso e persistente que só pode despertar a desconfiança e a inveja nos vizinhos.
Críticos como Sílvio Romero, Afrânio Coutinho e Alfredo Bosi têm apontado o caráter documental da obra de Aluísio de Azevedo, ao retratar a sociedade da época, muito embora, conforme observa Bosi, a influência do darwinismo tenha sido preponderante, pois o universo ficcional de Azevedo está pontilhado de indivíduos em uma luta inglória contra o meio. Em uma outra perspectiva, é digna de particular atenção a análise de Suely Reis Pinheiro, em "Vozes da sedução, do picarismo e da negritude", na qual interpreta a criação romanesca do autor como uma tentativa de desarticular a hegemonia do colonizador. Para tanto, Aluisio de Azevedo confere ao negro uma aura de sedução irresistível e ao português os limites do estereótipo.
Em O cortiço (1890), romance naturalista de Aluísio Azevedo, o autor constrói três imagens do imigrante português (Jerônimo, João Romão e Miranda) que revelam faces diferentes do processo de aculturação.
João Romão é o protótipo do português ganancioso, cuja preocupação em fazer fortuna é tão grande que leva ao relaxamento com a própria aparência, a sujeição ao desconforto e a auto-imposição de um regime de trabalho que ultrapassa muitas vezes o limite físico. A trajetória da personagem constitui a metonímia do embate da raça com o meio, pois o seu pragmatismo está permanentemente em confronto com a indolência e a sensualidade do temperamento dos habitantes do país que o acolhe:
Proprietário e estabelecido por sua conta, o rapaz atirou-se à labutação com mais ardor, possuindo-se de tal delírio de enriquecer, que afrontava resignado as mais duras privações. Dormia sobre o balcão da própria venda, em cima de uma esteira, fazendo travesseiro de um saco de estopa cheio de palha. (Azevedo, 1997,13)
A sua posterior "aristocratização", atingida após uma profunda modificação em seu comportamento e em sua aparência física, embora revele a ação do meio sobre o comportamento humano e se apresente como uma conseqüência do evolucionismo, não deixa de se apoiar no pragmatismo da personagem, que, após enriquecer, passa a alimentar o sonho de ganhar títulos nobiliárquicos.
Jerônimo, por sua vez, percorre o caminho inverso. É, a principio, delineado como homem honesto, fisicamente forte, de caráter sério e bons costumes, admirado pela sua simplicidade e disposição para o trabalho. Assim que chega ao cortiço, mantém o comportamento saudosista do imigrante, a busca de fidelidade às origens, que se revela, por exemplo, por meio do hábito de sentar-se à porta, dedilhando os fados de sua terra natal:
Era nesses momentos que dava plena expansão às saudades da pátria, com aquelas cantigas melancólicas em que a sua alma de desterrado voava das zonas abrasadas da América para as aldeias tristes da sua infância. E o canto daquela guitarra estrangeira era um lamento choroso e dolorido(...)(Azevedo, 1997, 48)

Estudos sobre a imigração têm comprovado que a música e a culinária são marcas de resistência à aculturação absoluta, ou assimilação, operando como expressões privilegiadas de uma vida entre dois mundos.
Após conhecer Rita Baiana, uma mulata sensual, Jerônimo se torna um homem diferente. Abandona a esposa e a filha, trama o assassinato do amante de Rita, endivida-se, aproximando-se da imagem do malandro carioca.
Os primeiros sinais da transformação dão-se justamente na esfera onde naturalmente se opera a resistência, pois logo Jerônimo passa a rejeitar a culinária de sua terra, perguntando à mulher porque não experimenta fazer "uns pitéus à moda de cá" (Azevedo, 1997,76), e deixa a guitarra de lado, exceto para tentar tocar as modinhas que Rita Baiana cantava.
O abrasileiramento de Jerônimo traduz a perspectiva naturalista de sujeição aos imperativos do ambiente, que traduz, igualmente, um completo processo de assimilação.
Miranda é o típico português ambicioso que, no entanto, prefere enriquecer por meios mais brandos, como pelo casamento com uma brasileira cujo dote era o que garantia a sua loja de fazendas por atacado. A manutenção da situação econômica atingida era mais importante do que seu orgulho de homem, posto que, apesar de saber-se traído, não ousava separar-se dela:
Prezava, acima de tudo, a sua posição social e tremia só com a idéia de ver-se novamente pobre, sem recursos e sem coragem para recomeçar a vida, depois de se haver habituado a umas tantas regalias e afeito à hombridade de português rico que já não tem pátria na Europa. (Azevedo, 1997,16)

A recepção do português pela população citadina era permeada pela animosidade. Além de serem vistos como concorrentes em potencial, dada a monopolização lusitana em certos ramos de trabalho, havia sempre aqueles que, não tendo conseguido integrar-se na economia urbana, acabavam por reproduzir traços da economia de subsistência, tornando-se prestadores de serviços, como é o caso de Jerônimo, em O cortiço.
O imaginário em relação aos portugueses foi-se delineando a partir dessas características, conforme afirma Gladys Ribeiro:
Os portugueses foram os bodes expiatórios responsabilizados pelas crises econômicas da República iniciante. Eram considerados culpados e acusados de explorarem a população cobrando aluguéis extorsivos e juros alucinantes sobre dinheiro emprestado, bem como roubando nos pesos e medidas nas vendas, freguês, botequins, quiosques e casa de pasto. Caracterizados como intermediários, pesavam-lhes sobre os ombros a carestia e a vida surrada das camadas populares. (Ribeiro, 1990, p.13).

A divulgação dessas idéias era comum tanto na imprensa como na expressão literária. A denominação de "galego", atribuída aos portugueses, aparece no discurso jornalístico num sentido pejorativo (Alencastro e Renaux, 1990, p.312), difundindo-se como um xingamento que fazia as delícias do povo brasileiro.
Os estereótipos apresentam algumas características que auxiliam sobremaneira a formação e desenvolvimento da opinião pública: são persistentes; podem permanecer por gerações; são elaborados por um grupo para definir-se ou definir outro grupo; apresentam uma imagem idealizada do próprio grupo; apresentam a esquematização, onde as qualidades de um objeto são reduzidas a uma só; englobam todos em único conceito, bem como têm função compensatória de frustrações, responsabilizando sempre o outro pelo próprio fracasso.
Criar estereótipos, alterar e induzir opiniões requer instrumentos de persuasão. A persuasão tem na propaganda sua melhor arma de ação, pois a propaganda pode ser definida como uma técnica que manipula as representações, os estereótipos e influência as ações humanas, as atitudes das pessoas. A postura antilusitanista teve, portanto, na imprensa e na literatura as suas grandes aliadas.
Os mecanismos que normalmente são considerados de inclusão, e que se verificam na maioria dos países, não se aplicaram aos imigrantes portugueses por motivo óbvios. Nos EUA, por exemplo, os critérios de assimilação que abrem o caminho à classe média americana, e que, segundo Salins (1997), têm-se mantido inalterados ao longo dos anos, se apóiam sobre três pilares: o domínio do inglês, a conquista nos estudos e o sucesso econômico.
Na fase da grande onda migratória portuguesa para o Brasil, nenhum desses critérios poderia ser considerado como fator de adaptação. Primeiramente, pelo fato de que, tendo sido colônia portuguesa, o fator lingüístico como diferença inexistia, muito embora o sotaque ainda permaneça como referencial do estereótipo. Em segundo lugar, o nível cultural do povo brasileiro em geral era baixíssimo, com exceção de uma minoria socialmente privilegiada, não havendo, portanto, a possibilidade de se colocar o brasileiro como modelo. Por último, era justamente o sucesso econômico dos imigrantes portugueses que gerava o comportamento xenofóbico dos brasileiros.
Houve, então, por parte dos antilusitanistas a necessidade de fortalecer os mecanismos de exclusão pelo estereótipo, pela visão negativa do imigrante português: um indivíduo suarento, de tamancos, com sua indefectível camiseta branca, um farto bigode e bolsos cheios de dinheiro.
Um exemplo disso, também observável em O cortiço, é a recomendação de Jerônimo à mulher de que passe a tomar banho todos os dias, uma vez que o clima no Brasil era diferente do de Portugal. Aluísio Azevedo busca marcar essa oposição ao descrever Rita Baiana, dizendo que "toda ela respirava o asseio das brasileiras e um odor sensual de trevos e plantas aromáticas" (Azevedo, 1997, 50).
O movimento em favor do fortalecimento do luso-brasilianismo encontra eco na Comissão Luso-brasileira, a partir de quando começa a difundir-se a noção de uma comunidade lusófona, que teve em João do Rio um dos seus mais ativos defensores.
Muitos dos primeiros imigrantes e, com certeza, seus descendentes passaram pela experiência da conformação identitária dual, fundamentada, ao mesmo tempo, na sociedade de origem e na "adotiva", posto que, ainda ligados pela herança ancestral a Portugal, experimentavam um modus vivendi tipicamente brasileiro.
Aos primeiros imigrantes se somaram os seus descendentes, intensificando tensões, crises e conflitos e ao mesmo tempo significados, vivências e horizontes, que foram impondo, ampliando e multiplicando as experiências de "transculturação" (Ianni, 1996).
Para Fernando Ortiz (1983), antropólogo cubano que cunhou o termo "transculturação", a América só pode ser compreendida por meio de uma reavaliação séria do processo de mestiçagem de raças e culturas que se sobrepõem a qualquer outro fenômeno histórico.
Deste modo, os modelos teóricos de aculturação existentes, unidirecional, bidimensional e interativo, tendem a ser superados por uma visão que vá além do paradigma linear dicotômico, consistindo em uma perspectiva que privilegia o enfoque multidimensional e interdependente, dentro de uma dinâmica de mudança e desenvolvimento constantes.
Nessa breve análise da participação das mídias na formação e conformação identitária dos imigrantes portugueses no Brasil; não podemos deixar de mencionar o fato de que, no mundo contemporâneo, a representação da diferença via "etnização" ou "racialização" das dinâmicas migratórias continua a provocar um esvaziamento da percepção do pluralismo cultural, bem como o fortalecimento de estereótipos que, via de regra, não atingem só o imigrante, mas também operam como forças discriminatórias dentro de um mesmo território nacional.
Exemplificamos sem ter a necessidade de ir muito longe. A Revista Veja,(2) de 25 de agosto de 1999, mencionava o fato de que o Brasil é visto pelo estrangeiro como um país hospitaleiro, onde o imigrante é bem recebido e adapta-se com facilidade bem maior dos que os brasileiros do norte e nordeste, que sofrem de maneira muito mais dura o peso do preconceito regional. Os imigrantes portugueses contemporâneos que o digam, pois já vai longe o tempo em que o retrato mais bem acabado do imigrante português no Brasil se resumia a um senhor bigodudo, de camiseta e tamancos, atrás de um balcão de botequim ou padaria. Nos últimos anos, segundo o Ministério da Economia de Portugal, têm sido significativos os investimentos de empresas portuguesas no Brasil. E o velho estereótipo vai sendo substituído por empresários que já ocupam a quinta posição na lista dos maiores investidores em solo brasileiro.
O Brasil é um país de imigrantes, construído sobre a confluência de múltiplas diferenças. A tão propalada imagem de um país receptivo ao estrangeiro tem sido interpretada de formas diversas: ora como submissão a uma nova forma de colonialismo imposta pela globalização, ora como um reflexo de um país que se reconhece multicultural. Claro está que, vez por outra, incidentes envolvendo cidadãos brasileiros, não especificamente em solo lusitano, mas no exterior em geral, reacendem o nosso velho ímpeto nacionalista, pendendo para uma reação xenofóbica freqüentemente transitória. Nada, porém, que não possa ser resolvido com um breve olhar sobre as nossas raízes ou, no caso de nossos "patrícios", com uma forma de revanche verbal que o brasileiro conhece muito bem, e que volta e meia retira do baú: uma boa "piada de português".

NOTAS
1 FORTES, Corsino ( 1980).
2 Revista de circulação nacional, com grande penetração no mercado e com um público-alvo de classe média que se interessa por questões sociais, políticas e econômicas.


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O imigrante português no Brasil: figurações e configurações da identidade cultural
Resumo: A situação específica do imigrante, assim como a do exilado, concorre para a formação de figurações e configurações múltiplas de identidade causadas pela busca do sentido de pertencimento e pela tentativa de recuperar o que Marc Augé denomina "lugar antropológico". Esta comunicação pretende analisar o processo de formação e representação da identidade cultural do imigrante, bem como o papel da literatura na construção do "locus" identitário. Abordaremos, igualmente, as estratégias de exclusão e inclusão e a formação de estereótipos, focalizando especificamente o fenômeno da transculturação em um panorama que envolve a coexistência do discurso imperialista e a experiência contemporânea da transnacionalidade.
Palavras - chave: imigração transculturação identidade representação



Abstract
The specific condition of the immigrant, as well as that of the exiled, contributes for either the formation of multiple identity constructions and representations due to the search for a sense of belonging and for the attempt to recover what Marc Augé has called anthropological place.
This presentation aims at an analysis of the process of formation and representation of the cultural identity of the Portuguese immigrant in Brazil, as well as the role of literature in the construction of the identitary "locus".
Similarly, it is our objective to deal with the strategies of exclusion and inclusion and the creation of stereotypes, focusing specifically on the phenomenon of transculturation within a panorama that involves either the co-existence of an imperialist discourse and the contemporary experience of transnationality.
Key words: immigration transculturation identity representation


Fonte: http://sincronia.cucsh.udg.mx/carreira04.htm

sexta-feira, 18 de janeiro de 2008

França: número de imigrantes ilegais desce em 2007

França: número de imigrantes ilegais desce em 2007


O número de imigrantes clandestinos em França diminuiu «cerca de 6 por cento» em 2007, revelou o ministro para a Imigração, Brice Hortefeux, adiantando que o número global se situa agora entre os 200 e os 400 mil. «A nova política de imigração tem dado resultados», defendeu Hortefeux numa entrevista ao jornal Le Fígaro, salientando que o facto de não haver uma redução no número de clandestinos «há uma geração».

Hortefeux admitiu, porém, que necessitava de estatísticas mais fiáveis, uma vez que baseou as suas previsões de descida, de imigrantes clandestinos, na redução daqueles que foram atendidos pelos centros sanitários públicos, e pelo aumento das expulsões feitas junto à fronteira.
«Sabemos que aqueles que não têm papéis são explorados por passadores e empregadores sem escrúpulos, que são os esclavagistas do nosso tempo«, disse o ministro.

Hortefeux assinalou ainda que as forças da ordem desmontaram 96 redes de trabalho ilegal e detiveram 3.456 pessoas.

O ministro disse ainda que o facto de terem endurecido a luta contra a imigração ilegal não significa que a França deixou de ser uma »terra de acolhimento«.

Diário Digital / Lusa
Fonte: http://diariodigital.sapo.pt/dinheiro_digital/news.asp?section_id=19&id_news=92783

quinta-feira, 17 de janeiro de 2008

Direitos dos trabalhadores estrangeiros



Direitos dos trabalhadores estrangeiros


Contratar um imigrante tem regras. A primeira passa pela legalização e pode ocorrer antes ou depois de começar a trabalhar. Envolve burocracia, mas espera-se que a nova lei agilize o processo.


O número de residentes estrangeiros em Portugal mais do que quintuplicou nos últimos 25 anos. Segundo o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF), em 2005, havia já cerca de 276 mil rostos de todas as latitudes a transformar a nossa paisagem humana. E estes são apenas os números oficiais, isto é, sobre quem está legalizado. Cada vez mais cidadãos nacionais empregam, em pequenos negócios ou no serviço doméstico, imigrantes nem sempre legais. Desconhece-se, assim, com rigor, quantos mais vivem no nosso país.

Neste artigo, explicamos as regras a seguir por quem tem ou pretende ter estrangeiros ao seu serviço. Como a situação dos cidadãos da União Europeia levanta menos problemas, analisamos sobretudo questões relacionadas com os restantes imigrantes.

Legalização lenta

- Muitos estrangeiros vivem entre nós de forma clandestina. Para resolver a questão, têm sido fixados períodos extraordinários de legalização. Recentemente, a Assembleia da República aprovou a nova lei da imigração, que entrou em vigor em Agosto, mas precisa de ser regulamentada no prazo de 90 dias. (NOTA: já foi regulamentada!!!)

- A legalização pode ocorrer antes ou depois de o trabalhador ter contrato. Para estarem legais, os imigrantes precisam de um visto de residência. Este pode, entre outros, destinar-se ao exercício de uma profissão por conta de outrem ou independente. Também existem vistos para trabalhar por conta de outrem temporariamente. Neste caso, duram o tempo do contrato, mas só em casos excepcionais podem ser superiores a seis meses.

- É possível prolongar o visto, mas, tratando-se de trabalho temporário por conta de outrem, só se o imigrante tiver contrato e for utente do Serviço Nacional de Saúde ou dispuser de seguro de saúde.

- O visto de residência permite ficar em Portugal quatro meses, para pedir a autorização de residência, e pode ser prolongado até um ano. A autorização é temporária (um ano, renovável por períodos de dois) ou permanente (renovada a cada cinco anos).

- A concessão do visto de residência a quem queira trabalhar depende da existência de empregos não preenchidos por portugueses, cidadãos do Espaço Económico Europeu (União Europeia, Islândia, Liechtenstein e Noruega) ou outros residentes em Portugal. Estes têm prioridade.


- No geral, a autorização de residência temporária só é concedida a quem, entre outros requisitos, tenha visto de residência válido, meios de subsistência, alojamento e inscrição na segurança social. Em casos excepcionais, pode não ter visto de residência, mas deve apresentar um contrato de trabalho. Outra via é a relação laboral ser comprovada por um sindicato ou a Inspecção-Geral do Trabalho (IGT). Tem ainda de ter entrado legalmente em Portugal e manter-se como tal. A inscrição e as contribuições para a segurança social também devem estar em dia.

- A autorização de residência permanente é atribuída a quem tenha a temporária há, pelo menos, cinco anos e conhecimentos básicos de português.

Contrato escrito

- Um estrangeiro a trabalhar tem os mesmos direitos e deveres de qualquer português. Mas é obrigatório ter contrato escrito. Esta formalidade só é dispensada para cidadãos do Espaço Económico Europeu ou de estados que tenham acordos com Portugal quanto ao livre exercício de actividades profissionais. Para obter estas informações, dirija-se ao Centro Nacional de Apoio ao Imigrante (CNAI), uma espécie de loja do cidadão para os estrangeiros. Aqui, poderá encontrar balcões do Alto Comissariado para a Imigração e Diálogo Intercultural, SEF, IGT e segurança social.

- O contrato, elaborado em triplicado, deve conter o nome e domicílio das partes, referência ao visto ou título de autorização de residência ou permanência, a actividade do empregador (dispensável no serviço doméstico), funções e retribuição, local e período de trabalho, datas de celebração e início da actividade. Nos contratos a termo, deve indicar a duração e a razão de ser a prazo.

- O trabalhador deve anexar ao contrato a identificação e morada de quem ficará a receber a pensão, se morrer devido a um acidente de trabalho ou doença profissional. Pode tratar-se de alguém a viver fora de Portugal e, para o processo ser mais rápido, as autoridades devem conhecer a identidade dos beneficiários.

- Uma cópia fica com o trabalhador, outra com o empregador. A terceira deve ser remetida à IGT com a comunicação escrita a que está obrigado quem contrata um estrangeiro. Se possível, tais documentos devem ser enviados antes do início do contrato.Quando este cessar, o empregador tem de informar por escrito a IGT no prazo de 15 dias.

- Ao exemplar do empregador, são anexados os comprovativos de que o trabalhador se encontra em Portugal legalmente. Por sua vez, aos do trabalhador e da IGT são juntas cópias destes documentos.


6 medidas para facilitar a legalização

Em Agosto, entrou em vigor a nova lei da imigração. Entre outros aspectos, pretende legalizar vários imigrantes que, até ao momento, não tinham essa possibilidade. Destacamos algumas medidas anunciadas.

1 - Passa a ser possível vir para Portugal sem contrato ou promessa de contrato. Basta provar que há uma oferta de trabalho e interesse de uma firma. 2 - Quem entre com visto de curta duração (por exemplo, para turismo), mas arranje emprego e se inscreva na segurança social, pode legalizar-se e obter uma autorização de residência. 3 - Um trabalhador independente, com início de actividade declarado nas finanças e contribuições para a segurança social, pode regularizar a sua situação, desde que tenha entrado legalmente no País. 4 - Os estrangeiros com visto de trabalho ou autorização de permanência podem iniciar uma actividade independente e passar recibos verdes. 5 - Uma família ilegal, mas com filhos na escola, pode pedir autorização de residência. Se for concedida, os pais têm o direito de trabalhar. 6 - Um estrangeiro legalizado pode mandar vir do seu país o cônjuge, a pessoa com quem vivia em união de facto, os filhos ou outros dependentes, ao abrigo do reagrupamento familiar.


- Se deseja contratar um estrangeiro, verifique se está legal (passaporte e visto que permita trabalhar). Em caso afirmativo, elabore o contrato escrito (pode obtê-lo no nosso sítio na Net) e informe a Inspecção-Geral do Trabalho (IGT). Depois, terá de fazer descontos para a segurança social e um seguro de acidentes de trabalho. - Na eventualidade de não saber se tem a situação regularizada, inclua no contrato uma cláusula que permita o fim da relação laboral se o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) recusar a legalização. Mas, mesmo que tal cláusula não exista, é possível terminar o contrato. Nestes casos, pode considerar-se que houve alteração das condições que levaram à contratação. - Se o imigrante não estiver legal, ajude-o junto do SEF e da IGT. Por exemplo, para desempenhar serviço doméstico, é preciso pedir um visto de trabalho ao SEF e fazer um requerimento à IGT. Deve entregar o contrato (ou promessa) e uma cópia do passaporte do trabalhador e IRS do empregador.

Informações

Centro Nacional de Apoio ao Imigrante (CNAI)

Rua Álvaro Coutinho, 14, 1150-025 Lisboa, 21 810 61 00. Serviço de Estrangeiros e Fronteiras

Rua Conselheiro José Silvestre Ribeiro, 4, 1649-007 Lisboa, 21 711 50 00, http://www.sef.pt/. Instituto do Emprego e Formação profissional

Centros de emprego ou 808 200 670 (dias úteis, das 10h00 às 23h00), http://portal.iefp.pt/. Inspecção-Geral do Trabalho

Praça de Alvalade, 1, 1749-073 Lisboa, 21 792 45 97, http://www.igt.gov.pt/.


Fonte: http://www.jornaldenegocios.pt/default.asp?Session=&CpContentId=303335

terça-feira, 15 de janeiro de 2008

Brasileiras e Brasileiros no Exterior: Cartilha com Informações Úteis

Segundo dados do Ministério das Relações Exteriores (MRE),
existem cerca de quatro milhões de brasileiros vivendo no
exterior, sendo a maioria composta por trabalhadoras e trabalhadores
que deixaram o País em busca de melhores oportunidades
de emprego e renda.

Esta dinâmica se incrementou a partir do início dos anos de
1990, gerando um fluxo migratório crescente, em especial,
para os Estados Unidos, Japão, Portugal e diversos países da
Europa.

Grande parte desses trabalhadores migra desconhecendo
os procedimentos para obtenção de vistos de trabalho, seus
direitos e deveres em outros países, os riscos das migrações
feitas de forma irregular, o perigo do tráfico de pessoas e o
papel das representações consulares brasileiras no exterior.

Nesse sentido, o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE)
percebeu que havia um vazio de informações relevantes para
esses trabalhadores e trabalhadoras. Além disso, identificou
a falta de informações sobre os direitos humanos e sociais,
deveres e obrigações inerentes à cidadania brasileira no exterior.
Tais informações poderiam ser prestadas por meio de
uma publicação informativa, a ser editada pelo Governo.
Percebendo tratar-se de uma tarefa complexa e abrangente,
envolvendo diversas áreas de Governo, o MTE estimulou
outros Ministérios a comporem uma comissão com a incumbência
de realizar essa tarefa.

Assim, a referida comissão foi estabelecida pela Portaria
nº 141/06 com vistas à criação da cartilha “Brasileiras e
Brasileiros no Exterior – Informações Úteis”. A comissão
foi composta por representantes do MTE, que a coordena,
além de representantes indicados pelos seguintes órgãos:
Ministério das Relações Exteriores; Ministério da Justiça;
Ministério da Saúde; Ministério da Educação; Ministério da
Previdência Social; Ministério do Desenvolvimento Social e
Combate à Fome; Secretaria Especial de Direitos Humanos; e
Comissão Nacional de População e Desenvolvimento.

Todo o trabalho foi secretariado pela Coordenação-Geral
de Imigração do MTE e contou com o apoio da Organização
Internacional do Trabalho (OIT), da Organização Internacional
para as Migrações (OIM), do Instituto Migrações e Direitos
Humanos, das Comissões de Relações Exteriores e Direitos
Humanos da Câmara dos Deputados e do Senado Federal.
Cada um dos Ministérios relacionados contribuiu com o aporte
de informações e conhecimentos específicos de sua competência,
sendo o resultado formalmente validado por seus
respectivos responsáveis. A edição dessa cartilha é, portanto,
fruto de um trabalho conjunto de diversas instituições.

Para que o processo fosse o mais amplo e democrático possível,
uma primeira proposta foi disponibilizada para consulta
pública, com objetivo de receber sugestões e críticas da
sociedade civil. Diversas propostas recebidas foram incorporadas
ao texto final. Também foram realizadas audiências
públicas, inclusive na Comissão de Relações Exteriores da
Câmara dos Deputados.

Um dos aspectos mais evidentes da globalização é o grande fluxo
de pessoas entre países e hemisférios. Segundo a Organização
das Nações Unidas (ONU), atualmente existem cerca de 200 milhões
de migrantes no mundo.

Os brasileiros, principalmente a partir dos anos de 1980, têm feito
parte desse movimento migratório internacional. Além das dificuldades de adaptação dos migrantes, aqueles em situação irregular sofrem ainda mais pela exploração, pelo medo
de serem deportados e pela discriminação a que podem ficar sujeitos.

Diante dessa realidade e considerando que cada brasileiro no exterior,
independentemente de onde se encontre, é um cidadão,
sendo em sua maioria trabalhadores, o Governo considera útil
esclarecer sobre os riscos da migração irregular e a respeito dos
direitos e deveres dos migrantes e suas famílias.

Faça o download da cartilha em
http://download.uol.com.br/ultnot/cartilha.pdf

Fonte: http://download.uol.com.br/ultnot/cartilha.pdf

segunda-feira, 14 de janeiro de 2008

Interculturalidade: Diálogo intercultural

Interculturalidade: Diálogo intercultural.


Artigo da autoria de Rui Marques, Alto Comissário para a Imigração e Diálogo Intercultural, publicado no Jornal Correio da Manhã no dia 9-1-2008.

O ano que iniciou é dedicado, na Europa, ao Diálogo intercultural. E bem. Num mundo que se globalizou radicalmente e onde (algumas) fronteiras se diluíram, afirmam-se o pluralismo è a diversidade como realidades incontornáveis. Os que acreditaram que a globalização representaria uma uniformização cultural ou religiosa enganaram-se redondamente. Pelo contrário, por acção ou reacção, a globalização conduziu ao efeito inverso. Nunca foi tão evidente, à escala micro e macro, que a Humanidade é um imenso puzzle de peças diferentes e que qualquer sonho de uniformidade cultural ou religiosa não tem viabilidade. Quer ao nível cultural quer ao nível religioso colocam-se importantes desafios de uma convivência pacífica entre diferentes tradições de povos vizinhos. Acresce que, graças à crescente mobilidade humana, no seio da própria Europa se torna evidente a necessidade de gerir essa diversidade cultural. Assim sendo, o único caminho é sermos capazes de gerir a diversidade. Porém, não se julgue que é de agora esse desafio. Ao longo de séculos, tendo pelo meio muitas etapas violentas de desencontro e de erros monstruosos, a Europa teve que gerir ao nível religioso a relação entre católicos e protestantes, ou entre cristãos e judeus. Também ao nível cultural, a presença de fortíssimas matrizes culturais - escandinavas, anglo-saxónicas, germânicas, francesas - exigiu esse esforço de diálogo e de encontro. Trata-se, agora, de renovar essa experiência.

Num primeiro nível, o Diálogo intercultural tem como foco essencial, numa sociedade plural, o reforço do sentido de pertença e a construção participada de uma comunidade de destino, partindo do respeito mútuo pela diversidade,' considerada um valor em si mesmo. Mais do que uma co-existência pacífica de diferentes comunidades eoindivíduos, o modelo intercultural afirma-se no cruzamento cultural, sem aniquilamentos, nem imposições. É uma dinâmica interactiva e relacional. Muito mais do que a simples aceitação do 'Outro' propõe-se o acolhimento do 'Outro' e transformação de ambos com esse encontro, decorrendo daí um novo 'Nós'. Sempre plural, mas também sempre coeso.

Note-se, para que não restem dúvidas, que o Diálogo intercultural se desenvolve sempre e só no quadro dos Direitos Humanos, da Democracia, do Estado de Direito com o primado da Lei. Do lado das obrigações, mas também dos direitos. Mas não admite que existam uns 'mais iguais do que outros', nem assume a Lei como algo de cristalizado e imutável. A opção intercultural é, de todas as políticas de gestão da diversidade cultural, a mais exigente: necessita, para o seu desenvolvimento, de convicção, investimento, negociação e transformação mútua. Por isso, o Ano Europeu do Diálogo intercultural é uma excelente oportunidade para investir neste caminho.

Fonte: http://www.acime.gov.pt/modules.php?name=News&file=article&sid=2142

sábado, 12 de janeiro de 2008

OCDE aponta demanda de mão-de-obra qualificada na Alemanha

OCDE aponta demanda de mão-de-obra qualificada na Alemanha

Großansicht des Bildes mit der Bildunterschrift: Fila em frente ao Departamento de Estrangeiros de Hamburgo: imigração deveria ser facilitada

Relatório sobre migração da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico registra falta de mão-de-obra qualificada na Alemanha e decréscimo no número de imigrantes legais registrados no país.
Segundo informações divulgadas pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) nesta segunda-feira (25/06), em Paris, a Alemanha deveria facilitar ao máximo a entrada de imigrantes capazes de exercer atividades qualificadas. Os problemas acarretados pela redução no número de habitantes do país deverão assolar de forma mais rápida e veemente a Alemanha do que outras nações européias, alertam os especialsitas.

De acordo com o relatório da organização, para compensar a perda no número de pessoas em idade ativa, a Alemanha deveria passar a receber, até 2010, cerca de 150 mil imigrantes por ano, pois até 2020, a percentagem da população ativa do país deverá sofrer um decréscimo de aproximadamente 6%. Além da Alemanha, a Itália e o Japão são os outros dois países da OCDE que, já agora, apresentam uma redução da população economicamente ativa.

Melhor integração

Bildunterschrift: Großansicht des Bildes mit der Bildunterschrift: Cursos para estrangeiros em Frankfurt: tentativa de integraçãoAs lacunas que vão aparecer no mercado de trabalho não deverão, porém, ser preenchidas apenas através da imigração, alerta Heino von Meyer, diretor do centro da OCDE em Berlim. Para compensar as perdas drásticas de força de trabalho, deveria haver uma melhor integração dos estrangeiros que já vivem no país e uma melhoria nas chances de emprego para mulheres e idosos, observa o especialista.

Em alguns casos, como o de trabalhadores altamente qualificados e de trabalhadores capazes de prestar assistência a idosos e enfermos, o problema da falta de mão-de-obra já é hoje evidente na Alemanha, aponta Von Meyer.

Legais e ilegais

O relatório da OCDE registra um aumento de residentes legais com visto permanente nos países-membros da organização, que passou em 2005 para quatro milhões de pessoas em 2005, em contraponto aos 3,5 milhões registrados no ano anterior.

Por outro lado, em 2005 a Alemanha teve 13 mil imigrantes legais a menos que em 2004. Já os imigrantes ilegais ne Europa perfazem um total de 1% da população, segundo os técnicos da OCDE.

Requentes de asilo

Bildunterschrift: Großansicht des Bildes mit der Bildunterschrift: Número de requerentes de asilo caiu em 2005Na Alemanha, Áustria, Bélgica, Reino Unido, Dinamarca e Portugal, 30 a 40% dos imigrantes residentes chegaram ao país com vistos de trabalho. O número de requerentes de asilo nos países da OCDE continuou a diminuir em 2005, com 300 mil pedidos por ano, o que significa a metade do número de requerimentos recebidos no ano de 2000. Aproximadamente 23% dos requerentes de asilo provêm da África.
Em termos absolutos, o número maior de pedidos de asilo político foi feito na França – que registrou 42 mil requerimentos ao ano – seguida do Reino Unido e da Alemanha, com 30 mil pedidos anuais. Em termos relativos, ou seja, em relação à população local, a Áustria foi o país da OCDE que mais recebeu requerimentos de asilo.

Fonte: http://www.deutsche-welle.de/dw/article/0,2144,2631655,00.html

sexta-feira, 11 de janeiro de 2008

Derechos Humanos y Inmigración

DERECHOS HUMANOS Y INMIGRACIÓN

Augusto Klappenbach Minoti.


El tema que voy a tratar se resume en las siguientes preguntas:
· ¿En qué se fundamentan los derechos humanos? ¿Sólo en nuestro modo de vida occidental?
· ¿Tenemos derecho a exigir a los inmigrantes, gente que viene de culturas distintas de la nuestra, que acepten y cumplan esos derechos? ¿O hay que aceptar sin críticas las costumbres que traigan de sus países de origen? (como los matrimonios forzosos, la ablación del clítoris, los castigos físicos en las familias, la negativa a escolarizar a sus hijos, etc.).
El tema es importante, porque, nos guste o no, nuestras sociedades serán cada vez más interculturales, como sucede en toda Europa. No se puede vivir en una isla de riqueza en medio de un mar de chabolas sin que se produzca una incesante migración del segundo grupo al primero. Y conviene recordar que de los 6 mil millones de habitantes de nuestro planeta, no llegamos a la mitad los que comemos tres veces al día, tenemos agua corriente, electricidad, calefacción y vacaciones pagadas. Este es el verdadero “efecto llamada” para la inmigración: no habrá policía que pueda frenar este flujo.

I. El fundamento de los derechos humanos.
Como se sabe, los derechos humanos se formulan en una primera versión en la Revolución Francesa, a fines del siglo XVIII (Declaración de los Derechos del Hombre y del Ciudadano) y se concretan en la Declaración de las Naciones Unidas de 1948, enriqueciéndose después con numerosos tratados parciales.
Hoy se suelen distinguir tres grupos de Derechos:
· Los de primera generación, conocidos como derechos civiles y políticos, herederos directos de la Revolución Francesa (vida, libertad, seguridad jurídica, libertad de expresión, libertad religiosa, etc.)
· Los de segunda generación son los derechos económicos, sociales y culturales (seguridad social, trabajo, salud, alimentación, vivienda, educación etc.)
· Los de tercera generación, mucho más recientes, se refieren al progreso social, la ecología, etc. (el cuidado del medio ambiente, el patrimonio común de la humanidad, el desarrollo científico y tecnológico, etc.)
Tenemos derecho (y conviene) preguntarse en qué se fundamentan estos derechos. Se han dado por lo menos tres tipos diferentes de respuestas:

1. La compasión.
Vemos por televisión imágenes de niños desnutridos, ancianos abandonados en los países del Tercer Mundo. Muchas ONG basan su mensaje en el sentimiento de compasión y culpa que provocan estas imágenes. Una de ellas: “hay niños que no le dejan a uno leer el periódico tranquilo”.
No creo que haya que desvalorizar este sentimiento, que incluso tiene precedentes filosóficos, como la “pitié” de Rousseau o los sentimientos de Hume. Muchas veces ese impacto emocional es el que hace caer en la cuenta de la situación real en la que está este planeta.
Pero creo que este recurso a la compasión no es el mejor camino para fundamentar la necesidad de respetar esos derechos. Las apelaciones emotivas a las desgracias ajenas pueden impactarnos en un momento determinado e impulsarnos a alguna acción concreta, pero creo que por sí solo no llega a producir una convicción sólida. La compasión siempre es molesta, produce desasosiego (cambiar de canal mientras se está comiendo) Y resulta entonces frecuente la huída de imágenes y noticias terribles, el olvido de lo que ha producido ese mal momento y la costumbre de evitar esos impactos emocionales. O sea: la emoción (sola) dura poco y no llega a calar en la estructura del pensamiento. Incluso puede ser contraproducente.
Otra cosa es lo que se podría llamar “emoción racional”, es decir, la emoción o el sentimiento que se apoya sobre otro tipo de argumentos de valor universal, como veremos después.

2. El egoísmo racional.
Otra fundamentación de los derechos humanos se refiere a los beneficios que trae a los hombres el respeto universal de los derechos humanos. Se trataría de un pacto tácito de la humanidad civilizada: como me interesa que mis derechos sean respetados, debo respetar los derechos de los demás, para asegurar así una convivencia más satisfactoria para mis propios intereses. El egoísmo rechazable sería el egoísmo exclusivo: sólo importo yo y mis derechos personales, excluyendo a los demás de su disfrute. Pero el egoísmo inclusivo sería positivo: estoy dispuesto a pagar el precio de respetar los derechos de los demás, de incluirlos dentro de mis normas morales, para asegurar que se respeten los míos.
Esta corriente trata de evitar la hipocresía de tanta moralina falsamente altruista, de esos predicadores que se llenan la boca de exhortaciones a la virtud mientras sólo les preocupan sus propios intereses. El egoísmo bien entendido –dicen- empieza por casa pero no se queda en ella: abre su hospitalidad a toda la humanidad. Sólo que esa apertura no es el resultado de un imperativo categórico, de un esfuerzo de la voluntad, sino un subproducto del amor de sí, del acuerdo fundamental del sujeto consigo mismo.
Tales son los argumentos del egoísmo racional, a los cuales hay que concederles el mérito de sacar a la moral de ese ámbito hipócrita de las falsas generosidades y las falsas renuncias. Si con este egoísmo racional se quiere denunciar esa moral hipócrita y autocomplaciente y reivindicar una moralidad abierta, franca y compatible con la propia felicidad, nada hay que objetar a este egoísmo.
Sólo que esto es jugar con las palabras. Porque no se entiende entonces la diferencia entre un egoísmo así entendido con ese altruismo que se rechaza. Las palabras tienen importancia y el uso cotidiano es quien les otorga su significado. Desde este punto de vista, creo que elegir el término egoísmo para expresar la actitud ética tiene una de estas dos consecuencias:
a) O bien entendemos el término en su sentido habitual, (“inmoderado y excesivo amor a sí mismo, que hace atender desmedidamente al propio interés, sin cuidarse del de los demás”) y en tal caso resulta incompatible con el hecho moral, en la medida en que los demás son considerados como “resistencias a dominar” antes que como “fines a respetar”.
b) O bien se extiende tanto su significado que termina coincidiendo con la superación del propio interés, que es casi lo contrario de lo que se entiende por egoísmo.
Porque el “egoísmo”, si tomamos en serio la palabra, tiene límites que no se pueden superar por más que se agregue la apostilla de “racional”. Si la defensa de los derechos humanos se basa en el interés propio, no resulta fácil explicar, por ejemplo, la preocupación por las generaciones futuras que implica el cuidado del medio ambiente, así como la defensa de estos derechos en zonas tan alejados de nuestro entorno que difícilmente podrán influir en nuestro modo de vida. Insisto, a menos que ampliemos tanto el significado de la palabra yo que termine significando algo tan alejado del sentido habitual de la palabra que la expresión “egoísmo racional” resulta entonces más que confusa.

3. Los derechos humanos se justifican a sí mismos.
Las fundamentaciones anteriores (la compasión y el egoísmo racional) no son falsas, pero creo que son incompletas. Como traté de mostrar, ninguna de las dos acaba de explicar el derecho absoluto que tiene cualquier ser humano a gozar de esos derechos fundamentales, aunque tengan parte de razón.
Creo que la mejor fundamentación suena a perogrullada: se deben respetar los derechos humanos porque los seres humanos tenemos esos derechos. Dicho así, parece un círculo vicioso.
Pero este círculo vicioso tiene antecedentes ilustres. Hace más de doscientos años, Kant expresó así el fundamento de los derechos humanos: “Trata a la humanidad, tanto en tu persona como en la persona de los demás, siempre como un fin y no sólo como un medio”. Probablemente se trata de una las expresiones más profundas que se han formulado nunca acerca de la moral.
La diferencia entre un fin y un medio es la siguiente: el fin vale por sí mismo, el medio sólo vale para conseguir el fin. El dinero, por ejemplo es un medio. El equipo de música que queremos comprar con él es un fin. Pero también este equipo es un medio para otra cosa (para escuchar música) y así sucesivamente. Lo que Kant quiere decir es que el ser humano es un fin absoluto, un fin que no se puede poder en función de ningún otro fin superior. Al reconocimiento de este hecho Kant lo llama “respeto”.
Lo cual no quita que el ser humano también es un medio: cuando voy a la peluquería el peluquero es un medio para cortarme el pelo y yo soy un medio para que el peluquero se gane la vida. Pero, como dice Kant, no somos sólo medio: el respeto que nos debemos va más allá de la utilidad que tenemos uno con otro. Y por eso no sólo debo pagarle al peluquero, también respetarlo, como él a mí.
Y hay que advertir que no sólo los demás sino yo mismo soy un fin. Por eso, yo también debo exigir que se me respete, que no se me utilice como un mero instrumento: no se trata de poner la otra mejilla ante una violación de mis derechos. Por eso no se trata de elegir entre egoísmo y altruismo; los derechos humanos se exigen donde quiera que haya un ser humano, sea yo u otro.
Todo esto, según Kant, no se puede demostrar. Es un hecho, como lo es la salida del sol. Y si alguien pusiera en duda esta necesidad de respetarnos unos a otros como fines en sí mismos y dijera, por ejemplo, que sólo debo ocuparme de lo que a mí me interesa, utilizando a los demás como medio para mi conveniencia, Kant le diría que no puede seguir hablando, ya que no puede darle ninguna razón para convencerlo.
Se trata de un proceso parecido al de una persona que no distinga el valor estético de una sinfonía de Beethoven del escape de una moto: no existen “razones” que le puedan convencer de un valor estético que no percibe, Con la moral pasa algo similar: es un hecho y no el resultado de un razonamiento. ¿Por qué debo respetar al otro y no utilizarlo como un puro instrumento según mi conveniencia? Respuesta: porque debo, porque el otro es un ser humano que tiene derecho a ser respetado.
Pero este deber no es un puro capricho: es un deber razonable. Es irracional tratar a un ser humano como un objeto, tanto como tratar de enseñar álgebra a un perro. Porque debo tratar a cada ser como lo que es. Los seres humanos se resisten a ser instrumentalizados de una manera distinta que las cosas. Las cosas se resisten a ser tratadas como medios (el mármol y el tronco se resisten al escultor y al hachero) pero esta resistencia se mide en más y menos, es puramente cuantitativa. En cambio el ser humano se resiste “absolutamente”. Incluso se resiste más cuanto más débil es: es más fácil atacar a un soldado que a un bebé.
Y aquí sí que tiene su lugar el sentimiento, pero creo que antes que el sentimiento de mera compasión o de lástima el sentimiento más importante es el de indignación, de rebelión ante el hecho (otro hecho) de que los derechos humanos sólo se respetan en ámbitos reducidos de nuestro planeta, y ni siguiera en nuestras naciones orgullosamente llamadas “desarrolladas”.
Este carácter de “fin en sí” que tenemos los humanos no depende de nada: ni del color, ni del sexo, ni de la edad, ni de la inteligencia. Vale tanto para un premio Nóbel como para un idiota de nacimiento, porque la razón por la cual consideramos al ser humano “fin en sí” consiste solamente en el hecho de que es un ser humano, y nada más. Y por eso esta experiencia moral excluye totalmente el racismo, el sexismo, la xenofobia y cualquier tipo de discriminación.
Y eso nos lleva a la segunda parte de esta charla.

II. La inmigración.
Repito la pregunta: ¿Con qué derecho –si es que existe alguno- se exige respeto a los derechos humanos más allá de los límites de la cultura occidental que los ha formulado?
El hecho de que esta Declaración haya sido aprobada por muchas naciones no occidentales no puede hacer olvidar el hecho de que tanto su forma como su contenido –no tanto su observancia- responden a la tradición ilustrada de la Europa moderna y a la influencia de Occidente en las resoluciones de las Naciones Unidas. ¿No resulta entonces la calificación de universales un tanto presuntuosa, por no decir imperialista? De hecho, millones de personas cuestionan hoy explícitamente no pocos de estos supuestos derechos universales, como el de la libertad religiosa y la igualdad de derechos de los sexos.
El cuestionamiento a esta universalidad no surge sólo de culturas diferentes a la nuestra. Hacia la década de los ochenta aparecen en la escena intelectual de occidente los llamados comunitaristas, cuyas tesis, inevitablemente simplificadas, vienen a decir lo siguiente: las instituciones y normas de una cultura –incluyendo las normas jurídicas y morales- sólo pueden ser juzgadas en el interior de esa cultura. Los derechos y obligaciones sólo tienen sentido dentro de una comunidad determinada, que regula las relaciones entre los individuos de acuerdo con la forma de vida de esa comunidad, y por tanto no son exportables a formas de vida diversas. Hay que renunciar, por lo tanto, a cualquier criterio universal que pretenda juzgar la superioridad o inferioridad de comunidades heterogéneas entre sí. Lo cual no implica, dicen algunos, encerrarse en la propia cultura: se trata de “seguir la conversación”, abriéndonos a nuevas perspectivas culturales. Desde este punto de vista, los derechos humanos verían limitada su extensión al marco de las comunidades que los acepten,
Hay que reconocer que este discurso es atractivo. Si nuestra cultura posmoderna ha renunciado a cualquier referente religioso o metafísico de carácter trascendente, ¿en qué puede fundamentarse un criterio que pretenda gozar de validez universal y que por lo tanto se arrogue el derecho de juzgar éticamente normas morales nacidas de tradiciones distintas? Seguramente, dicen los comunitaristas, en la tradicional prepotencia de occidente, que pretende convertirse en paradigma universal sin atender a sus propias miserias. En lo cual, por cierto, no andan descaminados.
El comunitarismo tiene, sin embargo, un punto débil muy significativo, que consiste en su discrepancia con el sentido común. Si llevamos al límite la lógica comunitarista encontraríamos, por ejemplo, que determinadas prácticas tradicionales de algunas culturas como la ablación del clítoris de las niñas o la antigua costumbre india de quemar a la viuda junto con el cadáver de su marido, si bien resultan repudiables en nuestra cultura, gozan de plena legitimidad moral en el interior de la cultura que las practica, de tal modo que no existen razones para condenarlas, situando así esas prácticas al mismo nivel que el reconocimiento de los derechos de la mujer.
El sentido común moral tiene derecho a rebelarse contra esta equiparación: dígase lo que se diga, una cultura que acepta tales prácticas es inferior moralmente hablando –y sólo en lo que se refiere a estas costumbres- a las comunidades que reivindican la igualdad de derechos entre los sexos. Y si esta afirmación suena a eurocentrismo o a metafísica, tanto peor: no por ello deja de ser cierta. Como traté de mostrar antes, la exigencia de tratar a todos los seres humanos como fines en si es una exigencia absoluta, que no depende del color, de la raza o de la religión. Cualquier tradición, por más arraigada que se pretenda, debe ceder ante el carácter universal de los derechos humanos, incluyendo las tradiciones religiosas que deben acostumbrarse a coexistir con otras religiones en el marco de las sociedades democráticas. Renunciar a este carácter universal de los derechos humanos equivale a negar estos derechos.
Sin embargo, el comunitarismo tiene sus razones. Y quizás la más respetable haya que buscarla en el tipo de universalidad que nuestra cultura occidental ha intentado imponer. Porque hay dos tipos de universalidad: uno de ellos, entre nosotros el más frecuente, consiste en establecer un modelo surgido de la propia cultura y erigirlo en paradigma universal, confundiendo los verdaderos derechos humanos con nuestros usos y costumbres. Y ya sabemos que esta imposición no se limita a inocentes elucubraciones filosóficas: todas las formas de colonialismo aducen una legitimación sustentada en una concepción universalista de este tipo. Piénsese, por ejemplo, en el exterminio de las culturas indígenas que llevaron a cabo los conquistadores europeos durante la conquista de América, o en las políticas neocoloniales del siglo XIX, todas ellas legitimadas en la superioridad religiosa o cultural del modelo europeo.
El otro tipo de universalidad tiene como punto de partida el reconocimiento de la diferencia. Lo universal no surge en este caso de la imposición de un modelo sino de la búsqueda de elementos comunes en las diferencias culturales. De hecho, el germen de los derechos humanos está presente en todas las culturas, aun en las más primitivas, aun cuando se encuentren restringidos en su comprensión y su extensión, limitados a determinados individuos o grupos, arbitrariamente definido su alcance. De tal modo que reivindicar la universalidad de esos derechos no consiste en imponer un marco cultural distinto sino en desarrollar esos gérmenes que ya existen en esas comunidades, aun cuando este desarrollo entre en conflicto con la cultura “oficial”. No habría que olvidar que ninguna cultura es homogénea ni confundir las tradiciones culturales con la instrumentación que de ellas hacen los grupos dominantes. Las niñas que se resisten a la infibulación también forman parte de su comunidad y sus derechos son más legítimos que los que aducen sus verdugos.
Lamentablemente, y con mucha frecuencia, la defensa occidental de los derechos humanos ha confundido universalismo con etnocentrismo, utilizando la universalidad como vehículo de sus propios intereses.
Y para terminar, permítaseme un ejemplo concreto: la cuestión del velo islámico, que en Francia ha sido prohibido en los colegios y otros lugares públicos.
Las discusiones acerca del multiculturalismo deberían partir de un hecho que me parece indiscutible y que no por sabido resulta superfluo recordar: nos guste o no, nuestras sociedades occidentales serán cada vez más multiculturales, como dije al principio. Como también es inevitable que estas migraciones generen problemas: el rechazo de la xenofobia no debería conducirnos a un romanticismo que se quedara en el encanto folclórico de una sociedad colorista. La llegada de millones de personas de culturas diferentes plantea innumerables “cuestiones que se tratan de aclarar”, según la definición que da la Real Academia al término problema.
Uno de estos problemas es la aceptación o el rechazo de las costumbres que los inmigrantes traen de sus culturas de origen. Y teniendo en cuenta esa inevitable convivencia multicultural de que hablábamos antes, creo que sólo deberían prohibirse aquellas costumbres que atenten directamente contra lo que se entiende por derechos humanos. Es decir, aquellas prácticas que traten a la persona como un mero instrumento, que no respeten su dignidad de “fin en sí”, su capacidad de autodeterminarse. Como, por ejemplo, los matrimonios impuestos por los padres, el repudio de la mujer por parte del varón, la ablación del clítoris, la prohibición de estudiar o ejercer determinados trabajos a las mujeres, etc. Es evidente que en estos casos se está privando de derechos y libertades fundamentales a sus víctimas, a quienes no se les permite desarrollar de modo autónomo su vida sexual y profesional, por ejemplo.
Se dice que permitir el uso del velo islámico en los colegios abre la puerta a estos excesos. No cabe duda de que el velo islámico, como tantas otros usos de cualquier cultura, lleva tras de sí una carga secular de elementos simbólicos, entre los cuales figura, sin duda, la sumisión de la mujer en el contexto de un machismo de inspiración religiosa. Pero, a diferencia de los casos anteriores, no constituye por sí mismo una privación de derechos fundamentales para la persona que lo lleva, al menos no más que la imposición de normas en el modo de vestir que también exige nuestra cultura occidental, también cargadas de tradiciones morales y religiosas: nuestra concepción del pudor, por ejemplo, difiere bastante de la que rige en muchas tribus africanas. Y muchas mujeres no musulmanas utilizan prendas muy parecidas al velo islámico ocasionalmente por razones estéticas. ¿Es necesario entonces organizar una guerra de religión contra el velo, provocando así una reacción que aleje aún más la cultura islámica de la occidental encerrando a esas niñas en sus casas, o esperar a que la convivencia con otro modo de vida permita a las niñas musulmanas decidir por sí mismas sobre lo que deben llevar en la cabeza?
Otra cosa es, siguiendo con el ejemplo, el uso del burka, que somete a la mujer que lo usa a un aislamiento y una humillación incompatible con uno de los derechos humanos fundamentales, como es la no discriminación por razón de sexo.
Organizar Cruzadas a favor o en contra de símbolos siempre es peligroso. Lo hemos visto en España con las guerras de banderas, y algo similar puede suceder en nuestros colegios con la guerra del velo. Conviene reservar las energías para luchar contra prácticas aberrantes, como las mencionadas antes, y dejar que el tiempo y la tolerancia priven a los símbolos de su carga totalitaria. El comunitarismo constituye, sin duda, una doctrina irracional. Pero hasta las doctrinas irracionales tienen sus razones, y quizás la más respetable haya que buscarla en el tipo de universalidad que nuestra cultura occidental ha intentado e intenta imponer en el mundo. Tenemos una fuerte tendencia a investir con la dignidad de los derechos humanos lo que son simplemente usos y costumbres de nuestra cultura e intentar imponerlos como paradigmas de la civilización, como bien lo saben los pueblos que han sufrido nuestras aventuras coloniales. La sociedad multicultural que se avecina exige evitar la confusión entre aquellos principios irrenunciables que deben exigirse a cualquier inmigrante como condición para vivir entre nosotros, de otros usos y costumbres cuyo valor es más estético que ético. ¿Dónde está el límite? Una vez más, habrá que apelar al sentido común moral y renunciar a cualquier fórmula dogmática: el velo islámico no es lo mismo que el burka. Mientras este último impone una humillación denigrante para la mujer que lo lleva, el velo no pasa de ser un símbolo que difícilmente resistirá el paso del tiempo. Creo que esta cierta ambigüedad es preferible al fundamentalismo.


Debate
Tras esta exposición, cuyo texto escrito nos facilitó el propio ponente, se plantearon cuestiones referidas tanto a problemas concretos como a los fundamentos de los problemas y a los métodos para abordarlos.
Se insistió, por ejemplo, en la diferencia que supone el velo frente al burka, que pretende ocultar a la persona entera, y se habló de la poligamia y la poliandria como cuestiones abiertas a la decisión en el marco de sociedades abiertas que ya no tienen un modelo familiar institucionalizado. Del mismo modo que ante el rechazo a ciertos tratamientos médicos o a ciertos tipos de alimentación en los establecimientos públicos (cárceles, escuelas, hospitales ...), la respuesta no puede venir de una contraposición entre multiculturalismo e integración, sino de cierta flexibilidad en la determinación de las reglas de convivencia, compatible con la garantía de ciertos extremos irrenunciables. Porque el “fundamentalismo de la integración” procura disimular el hecho irreprimible de que, a partir del legítimo ejercicio de la libertad, somos distintos; y pretende crear una apariencia de homogeneidad cultural sobre la que asentar la convivencia común, cuando lo cierto es que la bandera de la homogeneidad cultural se agita sobre todo como falso señuelo para disimular que vemos en peligro otro fundamento diferente de nuestra convivencia pacífica, al que sin embargo produce cierto rubor apelar ante la miseria circundante: la relativa homogeneidad de condiciones económicas de vida próspera.
Se planteó también la posibilidad de aprender de otros ámbitos geográficos en los que existe experiencia de diversidad (desde los Balcanes hasta la India); aprender de sus soluciones y de sus conflictos. Pero también nuestra experiencia sirve como criterio de flexibilidad; ya que no somos una sociedad homogénea en la que sólo los inmigrantes planteen problemas, sino que hay ya cierta tradición de problemas surgidos de la diversidad cultural. Por ejemplo, el indeclinable deber de escolarización plantea en el colectivo gitano problemas que en absoluto se pueden considerar resueltos, y ante los cuales hemos desarrollado estrategias en buena medida elusivas, sólo en parte activas. Del mismo modo, a la hora de relativizar las diferencias y de formular propuestas flexibles nos puede ser de ayuda cobrar conciencia de que nuestra propia cultura es, también en el tiempo, diferente de sí misma, ha evolucionado profundamente; nuestra Historia más reciente, por ejemplo en relación con la situación de la mujer, nos debiera enseñar a comprender las dificultades en las que se ven otras culturas para asumir valores que nosotros hemos alcanzado apenas hace unos pocos años y a facilitarles el tránsito.


Augusto Klappenbach Minoti, hasta su reciente jubilación catedrático de Filosofía en el IES.

Fonte: http://es.geocities.com/respublica2010/augusto.html